A primeira coisa que precisamos lembrar é
que quando falamos de língua, estamos falando de sons. Emitimos
sons que têm significados e são processados por aquele que fala conosco e eles
reagem ao que falamos. A comunicação é realmente algo bastante intrigante, não
é? Com o tempo, a língua, que é imaterial, passa a ter sua representação
escrita. Passamos a materializar os sons com a escrita. Outro fenômeno bastante
incrível. Cada uma das letras que eu estou colocando aqui representa um som que
é interpretado por você que está lendo. Você entende os significados, aprende
coisas novas, nós nos comunicamos.
Quando representamos os sons na escrita,
usamos espaços, para clareza na hora de ler o texto. Esse espaço nem sempre
existe na fala. Escrevemos “pão de queijo” mas na fala o que acontece é /pãudikeiju/ (mais corretamente transcrito /pɐ̃w̃dikejʒʊ/).
Assim, temos três vocábulos formais “pãosubstantivo depreposição
queijosubstantivo”, mas na realidade fonética temos um só vocábulo
fonético “pãodequeijo”. Então, vamos ao crioulo...
O francês chega ao Haiti e diz “La
vérité”. O haitiano sabe que “la” é um artigo, “vérité” um substantivo, e que
os dois se escrevem separadamente? Não. Ele ouve uma coisa só, porque só há um
vocábulo fonético, ele ouve “laverite”. Daqui a pouco ele ouve só a palavra “vérité”,
o que acontece? Aparecem duas palavras com o mesmo significado: verite, laverite.
Temos vários fenômenos desse tipo em
português, resultado, sobretudo, do contato com os árabes. O português ouviu o
árabe dizer al-qurān e não distinguiu que “al” era o artigo definido árabe e o “qurān”
era a real palavra. Como faltou às aulas de árabe, tudo se uniu e o resultado
foi uma palavra só, “Alcorão”, que alguns puristas dizem ser correto apenas “Corão”.
Assim é que surgiram
palavras variantes em crioulo, como:
espri, lespri > espírito,
inteligência, mente
verite, laverite > verdade
Bib, Labib > Bíblia
kay, lakay > casa
gè, lagè > guerra
inivèsite, linivèsite > universidade
inivèsite, linivèsite > universidade
Não se confunda, no
entanto, com:
lapè (paz), pè (medo)
lafwa (fè), fwa (vez) etc.
Apesar de não haver
diferença entre as formas variantes, às vezes, um nativo vai preferir uma em
vez de outra. Um haitiano poderia falar li se yon moun (ki gen) lespri
> ele é uma pessoa inteligente, mas não falaria *li se yon moun (ki
gen) espri. Determinar quando usar uma ou outra não é tão fácil, não se
explica por nenhuma lógica gramatical, infelizmente. O importante é você não se
preocupar excessivamente pela escolha. Na maioria dos casos, tanto faz uma ou
outra forma.
Antes de eu me
despedir, lembre-se: la não é artigo em crioulo. Para dizer “a verdade”,
deverá dizer “verite a” ou “laverite a”.
Espero que mais uma
dúvida tenha sido esclarecida. Comente abaixo sobre o assunto de hoje! Até
mais!
Estou aqui com muita vontade de chorar! De alegria. Muito obrigada outra vez!!!
ResponderExcluirConte com o blog, Ligia.
ExcluirMuito bom! Esclareceu minhas dúvidas!!!
ResponderExcluirEssa eu achava que sabia. Só achava! Parabéns, Bruno. Muito obrigada!
ResponderExcluirObrigado
ResponderExcluirMuito bom, eu achava q laverite era "a verdade ", excelente, muito obrigada!
ResponderExcluirExcelente! Que explicação perfeita! Parabéns, seus artigos são sempre muito completos! Obrigado!
ResponderExcluirBonjou Irmão Bruno, suas explicações são fantásticas!
ResponderExcluirExcelente explicação Bruno.Mèsi anpil!!!!
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