Já
prometi este artigo há um bom tempo, a um bom número de pessoas. Muitas
coisas me fizeram deixá-lo para “mais tarde”. Chegou a hora.
Como
de costume aqui no blog, relembremos quais são os pronomes
demonstrativos do português:
—
Este, esta, isto: usamos quando algo está perto de nós. Se tenho um
livro à mão, digo “Este livro é muito bom”.
—
Esse, essa, isso: usamos quando algo está perto da pessoa com quem
falamos. Se o livro está na mão da pessoa com quem falamos, diz-se “Esse livro
é muito bom”.
—
Aquele, aquela, aquilo: usamos quando algo está em um terceiro lugar, em
que nenhuma das pessoas com quem estamos falando está. Assim, se estou falando
com alguém e aponto a um lugar em que nem eu nem a pessoa está, dizemos “Aquele
livro é bom”.
É
verdade que, modernamente, não temos feito a distinção que a gramática
recomenda. Por isso, “esse” e “este” (e as outras possibilidades) têm sido
usadas sem distinção. Isso não é um problema, a língua está mudando. Agora,
passemos ao crioulo e seu sistema de pronomes demonstrativos.
O
crioulo herdou do francês a maior parte do seu léxico, ou seja, as palavras que
compõem a língua haitiana. Com os pronomes demonstrativos não é diferente, e o
francês tem alguns pronomes demonstrativos (ceci, cela...). Dentre os pronomes
demonstrativos do francês, há um que pode substituir os outros, é o pronome ça.
Ele é usado mais na linguagem familiar, coloquial. Foi justamente o ça
que entrou no crioulo como pronome demonstrativo. Sua grafia foi adaptada ao sistema
do crioulo haitiano, e ficou como sa, visto que não há cê cedilhado (ç)
em crioulo haitiano.
O
sa, portanto, corresponde aos pronomes demonstrativos da língua
portuguesa (este/a, esse/a, isto/isso). O sa é usado para se referir a
coisas, objetos. Mas também pode ser usado para fazer referência a pessoas se houver
um termo no contexto que indique isso, como moun (pessoa), gason (homem),
fi (mulher) etc.
K = kreyòl (crioulo); P = português.
K:
Sa (a) se yon liv mwen renmen anpil
P: Este
é um livro do qual eu gosto muito
O a (artigo definido) às vezes
acompanhará o sa, resultando em sa a. Podemos pensar que sa
é esse, essa, isso. Sa a seria este, esta, isto. Em muitos
casos, será indiferente empregar sa ou sa a.
É notável que quando uma coisa já foi mencionada, e agora fazemos referência a ele novamente, usando esse pronome, o artigo aparece também, ficando sa a.
K: Mwen genyen yon liv kreyòl. Liv sa
a se trèzenteresan
P: Tenho um livro em crioulo. Este livro
é interessantíssimo
K: Liv sa a enpòtan anpil
P: Este livro é muito importante
O pronome demonstrativo que usamos
exclusivamente ao fazer referência a pessoas é sila. Vem do francês cela.
Visto que a vogal e francesa é, muitas vezes, tão átona, tão “fraca”,
passou a “i” no crioulo haitiano em alguns casos.
K: Li se sila mwen te mansyone a
P: Ele é aquele (a pessoa) que
eu mencionei
Muitas vezes o sila ocorrerá com
o artigo também, ficando sila a. Isso não muda o significado de nada,
mas pode deixar uma referência, uma alusão, mais específica (quando acompanhada
de artigo).
O plural de sa (a) é sa yo.
O plural de sila (a) é sila yo.
Haverá ocasiões em que sa e sila
servirão ora como dêitico (quando fazemos uma referência extralinguística, algo
não mencionado no texto/conversa, mas que se encontra no ambiente em que os falantes estão inseridos), e
muitas vezes retomarão ou anteciparão um termo que está por vir: são casos de
anáfora e catáfora. Como os nomes são muito feios, deixaremos os estudos de foricidade
para um artigo futuro. Paremos por aqui.
N ap wè.
P.S.: Logo
entenderemos mais sobre pronomes dêiticos, anafóricos e catafóricos, não se
preocupem.
Valeu Bruno estava esperando faz tempo essa exexplicaç.
ResponderExcluirMuito bom.... Grato!!!
ResponderExcluirMuito obrigado pela explicação clara de sempre!
ResponderExcluir