quarta-feira, 1 de março de 2017

Palavras femininas? Não exatamente.

     Umas das primeiras coisas que aprendemos sobre os substantivos em crioulo é que não há os gêneros masculino e feminino, diferente do português. Já tentou pensar na lógica do gênero de palavras? Se já tentou, viu que não há lógica.
     É isso mesmo, não há lógica. Algumas línguas (português, espanhol, italiano) têm palavras masculinas e femininas. Outras (inglês, crioulo haitiano) têm só o gênero neutro. Algumas outras (alemão, latim) têm masculino, feminino e neutro. Quanta confusão! Nenhuma lógica.
     Prova que não há lógica é carro ser masculino em português e espanhol, mas feminino em italiano e francês. Mulher em alemão é do gênero neutro (das Weib). Outra prova é que as palavras mudam de gênero com o passar do tempo! Sim, isso mesmo. A palavra fim é feminina em italiano e francês, é masculina em português moderno (o fim), mas já foi feminina em português arcaico! Assim como árvore já foi masculino (e é até hoje em espanhol, por exemplo) e planeta já foi feminino (e é até hoje em francês, por exemplo).
     Mesmo em línguas que não apresentam gênero de palavras, é comum transparecer um pouco dessa noção de gênero. O inglês possui um único artigo definido neutro (the). Algumas palavras, porém, tendem a ser referidas no feminino, como carro, navio. Mas, vamos  ao crioulo. E, antes de chegar lá, vamos a uma verdade importantíssima que não se pode deixar de lado:
“Ser a palavra do gênero neutro não significa que ela é irrestrita no uso. Uma palavra neutra pode ser restrita só a homens ou só a mulheres.”
     Geralmente chamamos as palavras restritas de marcadas. As irrestritas chamamos não-marcadas. Para entender melhor o conceito, reflita: a palavra dia é um termo não-marcado, é amplo; a palavra noite é um termo marcado, restrito a uma parte do dia, é menos abrangente. Em português, por exemplo, palavras masculinas tendem a ser não-marcadas, são mais abrangentes do que as palavras femininas. Quando eu digo ‘o homem está destruindo a terra’, esse homem refere-se a indivíduos de ambos os sexos. Essa é a razão de eu poder me dirigir a uma assistência composta de homens e mulheres por ‘senhores’, ou em ambiente religioso, por exemplo, por ‘irmãos’, mas não poder me referir apenas no feminino (senhoras, irmãs), a menos que a assistência seja exclusivamente composta por mulheres.
     Tudo isso explicado, vamos ao crioulo haitiano que tanto nos interessa. Primeira regra: todas as palavras são neutras, mas algumas apresentam formas exclusivas femininas. Isso acontece bastante com gentilícios, veja abaixo:
ayisyen (haitiano) > ayisyèn (haitiana)
brezilyen (brasileiro) > brezilyèn (brasileira)
ameriken (americano) > amerikèn (americana)
     Ao se referir ao povo de um país em geral, use a primeira forma, sem acento.
     Outras palavras que têm sua forma exclusiva feminina:
pwoklamatè (proclamador) > pwoklamatris (proclamadora)
kretyen (cristão) > kretyèn (cristã)
wa (rei) > rèn (rainha)
sèvitè (servo) > sèvant (serva)
     Vale lembrar que quando mudamos o final do substantivo não se trata, nesse caso, de flexão. Não há flexão de substantivos, ali se trata de sufixos derivacionais. Mas isso é só um detalhe técnico, rs! Estou ansioso para ler seus comentários e comentar suas dúvidas. Vamos enriquecer as discussões dos assuntos aqui no blog!
Até mais!

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